Sunday, December 19, 2004

Por que os direitos de propriedade são importantes? MST e os (outros) baleados do Pará

Sempre que falo de direitos de propriedade, alunos olham para mim com aquela cara de desconfiados: "Lá vem o Shikida com este papo capitalista de novo".

O fato é que "direitos de propriedade" não é algo que se prenda às preferências ideológicas das pessoas. Marx berrava aos quatro cantos sobre o "roubo da propriedade" pelos capitalistas. Dá para chamá-lo de capitalista? Não. O problema do argumento marxista, pelo menos o problema relevante para este artigo, é que o arranjo (design) de direitos de propriedade que ele gostaria de ver na prática torna a economia inviável. Somente isto.

Pois bem. Direitos de propriedade sempre estão sob disputa. No mercado, quando se compra um automóvel, o que ocorre é que o vendedor, mediante um pagamento, transfere o fluxo de bens e serviços proporcionados pelo automóvel ao comprador. O direito de propriedade sobre todo este fluxo, que antes era do vendedor, agora é daquele que o comprou.

Agora vamos ao MST. No "O Estado de São Paulo" de hoje, numa pequena nota da página A-13, o leitor poderá encontrar uma notícia que vai contra a corrente de grande parte do noticiário da imprensa brasileira: assentados foram baleados por gente ligada ao MST (claro, o MST nega, mas alguns assentados os acusam disso). Foi mesmo o MST? Não sei. Mas se observamos a questão do conflito, veremos que faz sentido que os baleados acusem a organização. Por que?

Segundo noticia o jornal, o MST tomou uma decisão que muda radicalmente os direitos de propriedade dos assentados. Qual foi? Vejamos a matéria: Na raiz do conflito está uma decisão tomada pelos dirigentesdo MST, que passaram a exigir que a titulação das terras seja feita em nome da associação e não dos assentados individualmente, como antes.

É claro que a mudança da alocação dos direitos está de acordo com as normas ideológicas do MST que tem origem basicamente socialista/comunista. Mas se trata de uma resolução que muda as regras da partida no meio do primeiro tempo. Afinal, qual o incentivo de um sem-terra de participar de exaustivas marchas ou de invasões de terra? Justamente a perspectiva de não ser mais SEM-terra. Isto significa, para ele, ter a posse de um pedaço de terra.

Quando o MST diz que a titulação da terra deve ser do MST - que, por sinal, é uma organização voluntariamente (até onde sei) fora da lei - ele sinaliza ao assentado que o mesmo não tem direito à terra. A terra é do MST, mas não de seus membros. Como isso é possível?

A resposta é: não é possível. Alguém deve ser o dono. Possivelmente quem decide nas esferas superiores do movimento. Mas, você me perguntará: "Cláudio, voltamos ao velho socialismo, com o que Milovan DJilas chamava de "a nova classe", não é"? Bem, é o que parece. E a importância disto para este artigo é que este tipo de arranjo não gera incentivos para o aumento da produção agrícola do país. Recentemente li um artigo em que se falava do fracasso destes assentamentos do MST neste sentido. Se a matéria estava correta ou não, não importa. O fato é que a mudança dos direitos de propriedade terá efeito sobre a produção. E será no sentido de desincentivar os assentados a produzirem.

Outro efeito colateral é o aumento da violência no campo. A frustração pode ser grande em quem era "sem-terra", virou "com-terra" e agora cede sua terra involuntariamente ao MST, tornando-se novamente..."sem-terra". Há quem diga que isto pode gerar um exército campesino de reserva permanente para uma organização de cunho marxista, mas não vou analisar ideologia aqui. Isto fica para a saudável reflexão do (e)leitor.

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