Thursday, December 23, 2004

Quanto mais rico, mais solidário?

Meu irmão disse, há alguns anos, quando passava por uma fase economicamente ruim em sua vida, que gostaria de voltar a contribuir para uma entidade de caridade. Mas, claro, para fazer isto, tinha de recuperar seu nível de renda prévio.

Este pequeno relato mostra que, ao contrário do que diz o senso comum, não é óbvio que o enriquecimento torna as pessoas mais avarentas. Como se sabe, explicar a relação entre riqueza e solidariedade não é fácil, mas toda boa ciência se inicia com observações individuais - o que é inevitável dado que o próprio cientista é um indivíduo - sobre fenômenos da realidade, e avança com a formulação de hipóteses acerca de aspectos diversos das variáveis analisadas (por exemplo, se existe ou não relação teórica entre elas, qual a causalidade entre as mesmas, etc).

Nos anos recentes cientistas sociais viram surgir novas hipóteses sobre os possíveis indutores do desenvolvimento econômico. Uma delas refere-se ao “capital social”. Este – que não deve ser confundido com seu homônimo contábil – diz respeito a redes de relacionamentos ou normas que ajudam indivíduos a alcançarem seus objetivos. Neste sentido, grupos terroristas e associações de bairros são dois lados da mesma moeda.

Assim, se o objetivo é estudar o “bom” capital social, i.e., aquele que minora os problemas socialmente mais comuns como os de “pobreza” ou “desigualdade”, então os grupos em estudo ficam mais facilmente identificáveis e, graças a uma recente pesquisa do IBGE, a vida do leitor interessado no tema ficou um pouco menos difícil.

Fala-se aqui da pesquisa sobre “fundações privadas e associações sem fins lucrativos no Brasil. A pesquisa é interessante pois: (i) elas nos permite ter uma (ou várias) medidas de “capital social” para os estados brasileiros e; (ii) é possível verificar uma hipótese sobre a relação entre riqueza – medida pelo PIB per capita dos estados – e “capital social” (medido pelo total estadual de fundações privadas e associações sem fins lucrativos).

Para se ter uma breve idéia do argumento, observe-se o gráfico abaixo que relaciona os dados de ambas as variáveis (ambas medidas em 2002 na escala logaritmica), para todos os estados brasileiros, inclusive o distrito federal.



Posted by Hello Fonte: IBGE (elaboração do autor)

Percebe-se que existe uma relação positiva entre as duas variáveis, i.e. , estados mais ricos, em média, são os mesmos que possuem mais capital social. Qual é a relação causal? O gráfico não nos permite dizer muito. Uma possível explicação é a de que aumentos da renda se traduzem em maior solidariedade na cesta de consumo (num sentido amplo) das pessoas. Em outras palavras: quanto mais rico, mais tempo tenho para me dedicar a atividades que acho prazerosas pois me dão uma agradável sensação de estar ajudando ao próximo.

Outra hipótese de causalidade, inversa à exposta acima diria que um maior nível de capital social geraria mais desenvolvimento econômico.

Qual hipótese é correta? São necessários mais estudos para se ter uma idéia clara desta relação. Além disso, os dados acima tratam de estados, não de indivíduos. Mesmo com todas estas limitações, o autor gostaria de acreditar na hipótese de que o que se ilustra é um resultado líquido da soma entre o “efeito-avareza” e o “efeito-solidariedade”, aparentemente positivo para a sociedade. Tomara que assim o seja!

Agradeço a Gilson Geraldino Silva Jr. por comentários e sugestões.

1 Comments:

Anonymous Anonymous said...

Gostaria de parabenizá-los pela iniciativa e dizer que a especulação sobre o papel do capital no processo de desenvolvimento é extremamente relevante para o debate atual. Capital social e respeito aos direitos de propriedade têm uma relação muito próxima. Acredito que isto também poderia ser explorado.

10:54 AM  

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